quinta-feira, 19 de agosto de 2010

ALEXANDRE III, O GRANDE (336 - 323 a.C.) - PARTE IX

A Mais Longínqua Alexandria
Bronze statue of AlexanderCom Dario III Codomano e Artaxerxes V Besso mortos, de agora em diante, Alexandre (imagem ao lado) era o soberano inconteste do Império da Pérsia, e ele ordenou aos seus homens continuarem a marcha para o norte de seu império para assegurarem sua fronteira contra incursões de várias tribos. Logo, eles chegaram as cidades de Nautaca e Maracanda (a Samarkand moderna) na satrápia da Sogdiana que a princípio fora estabilizada sob o domínio macedônico.  Quando o exército macedônio cruzou o rio Jaxartes (atual Syr Dar'ya), Alexandre poderia alegar que ele tinha chegado ao "fim da Ásia" dentro da visão geográfica antiga. Em julho de 329 ele fundou uma nova cidade, chamada Alexandria Eschate, "a mais longe Alexandria" (moderna Khodzent), sobre a antiga cidade de Kurushkatha (ou Cirópolis, “a cidade de Ciro”). Esta era para ser uma guarnição contra as tribos nômades do norte do rio, os sacas. Após cinco anos da batalha no Grânico (334 a.C.), o triunfo de Alexandre parecia completo. Até que chegaram mensageiros, dizendo que os sogdianos estavam em revolta. Abaixo, região de Sogdiana.

Sogdiana Revoltada
Espitamenes, o mesmo sátrapa que entregou Besso a Alexandre, era o líder da revolta. Provavelmente os invasores haviam insultado a população nativa que inicialmente os apoiara. Há o registro que Estasanor, um comandante de cavalaria, tentou dar um fim à prática de expor os corpos dos mortos para os cães e os abutres conforme as crenças do Zoroastrismo, e isso pode muito bem ter sido uma das causas da revolta dos sogdianos. Outra causa pode ter sido o confisco de rebanhos sogdianos pelos macedônios. Abaixo, representação de mercador sogdiano montado a camelo.
Era um novo desafio para o exército greco-macedônico: travar uma guerra num país de estepes empoeiradas que era inadequado para manobras da falange macedônica. Aos sogdianos juntaram-se os sacas, os massagetas e os dahas que eram excelentes arqueiros montados. Para esses cavaleiros poderosos, a cavalaria macedônica não se equiparava, e Alexandre foi forçado a reorganizar sua cavalaria fazendo uso de cavaleiros iranianos (persas, medas, arianos, etc.). A situação era temerosa, mas, Alexandre capturou sete fortalezas sogdianas e a população sofreu o mesmo destino que dos habitantes de Tiro  haviam sofrido (332 a.C.): os homens foram mortos e as mulheres vendidas. Abaixo, ilustração de Alexandre Magno liderando um ataque.
Durante um dos cercos, o rei macedônio foi ferido no pescoço. Durante a campanha de Alexandre contra os sete fortes, os cavaleiros de Espitamenes sitiaram a guarnição de Maracanda, e quando os soldados macedônicos começaram a marchar de volta para o sul, os sacas atacaram a retaguarda. Alexandre voltou para o norte, mas enviou mercenários gregos para Maracanda que foram aniquilados pelas forças de Espitamenes. Enquanto isso, Alexandre cruzou o Jaxartes e derrotou os sacas decisivamente de modo que esses se renderam. Ao voltar para Maracanda, Espitamenes havia se retirado. O exército de Alexandre nunca foi menor do que nos últimos meses de 329, e o rei teve que admitir que era incapaz de continuar a guerra. No entanto, ele devastou uma parte da Sogdiana de forma tão severa que fez que as insurreições diminuíssem. Em 328 Alexandre passou o inverno na Báctria onde esperava reforços militares vindos do Ocidente.  Na primavera, as forças macedônicas realizaram uma campanha surpresa ao longo do curso superior do rio Óxus onde fundaram a cidade de Alexandria do Óxus (conhecida hoje como Ai Khanum) cujas ruínas se veem abaixo.

Como Se Mata Um Amigo
Os macedônios realizaram campanhas de manutenção e defesa de seus domínios. Nessas campanhas o general Crátero fundou a cidade de Alexandria Margiana para privar os revoltosos do oásis de Margiana. Essas campanhas foram difíceis, mas bem sucedidas, embora Espitamenes continuasse sua campanha de guerrilhas e chegasse perigosamente perto das muralhas da Bactra. No entanto, os resultados da campanha de "pacificação", foram impressionantes e durante o inverno, Alexandre reuniu os exércitos que chegaram do Ocidente em Nautaca e Maracanda, e várias tribos e países vizinhos enviaram embaixadores ao Macedônio para concluir tratados (por exemplo, Corásmia). Abaixo, cena do filme Alexandre (2004): o Conquistador passa em revista seu exército.
Alexandre decidiu confiar as satrápias de Bactriana e Sogdiana a Clito, o Negro, seu amigo de infância que lhe salvara a vida na batalha do Grânico (334 a.C.) e um dos maiores chefes militares dos macedônios. Durante um banquete em Maracanda onde se comemorava também a nomeação de Clito, muitos cortesãos lisonjeavam Alexandre por suas vitórias. Alexandre, geralmente abstêmio, agora se embebedava. A bajulação incessante proclamava Alexandre maior que Hércules e filho de Zeus Ammon e desprezavam o pai humano de Alexandre, o rei macedônico Filipe II; outros faziam piadas sobre os comandantes que haviam sido derrotados e mortos por Espitamenes. Clito, que servira a Filipe II e conhecia os comandantes mortos, não pode tolerar esses insultos. Ele começou a elogiar Filipe e a defender os soldados macedônios ressaltando-lhes sua importância para as conquistas de Alexandre: isto é, qualquer que fosse a glória de Alexandre essa dependia também de seus valorosos soldados. Por fim, Clito lançou no rosto de Alexandre que lhe devia a vida, desprezou os costumes orientais do rei e citou-lhe os versos do poema Andrômaca de Eurípedes nos quais se denuncia que os líderes roubavam a glória do povo que lhes garantira as vitórias. Alexandre, bêbado, ordena que alguém vingue sua honra, mas ninguém ousa se levantar contra Clito. Bêbado e furioso, Alexandre toma uma lança e joga contra Clito que morre traspassado. Abaixo, Alexandre mata Clito atirando-lhe uma lança segundo a visão de Castaigne.

Clito, sendo um homem de educação helênica, não suportou a participação gradativa dos persas e de outros iranianos na administração e no exército e muito menos a valorização de Alexandre dos costumes orientais, incluindo o endeusamento do rei. Quando recobrou a sobriedade, o Rei ficou inconsolável. Durante três dias chorou o morto e pensou em suicídio chegando verdadeiramente perto da morte, porque se recusou a beber, inclusive água. Mas foi persuadido por argumentos religiosos, como por exemplo, de que Dionísio, deus grego do vinho, teria provocado o incidente por que Alexandre não o honrara, dentre outras versões. O que também pode ter ajudado é que o filósofo Anaxarco de Abdera, disse-lhe que o rei (como Zeus) é Justiça personificada, e, portanto, não pode agir mal. O que está feito está feito e é "justo". Abaixo, Alexandre inconsolável pela morte de Clito.


Espitamenes e a Rocha Sogdiana
Depois disso, Alexandre partiu de Maracanda com um grande efetivo para travar uma batalha decisiva contra Espitamenes. Dirigiu-se a região de Xenippa e tomou a fortaleza de Sesimitres. Receosos das forças militares macedônicas ou cansados da guerra, por fim os massagetas (ou dahas em outras versões) entregaram a cabeça de Espitamenes a Alexandre e fizeram a paz com o Conquistador. A filha de Espitamenes, Apama, casou-se com um dos generais de Alexandre, Seleuco, e dessa união nasceu a linhagem dos Selêucidas que governará o mundo helênico-oriental por vários anos. Abaixo, relevo do palácio de Persépolis que retrata um sogdiano.

A morte de Espitamanes não pôs fim a revolta contra os macedônios. Oxiartes, bactriano aliado de Espitamenes, estava entrincheirado numa fortaleza na montanha conhecida como Rocha Sogdiana. O local era de difícil acesso e considerado inexpugnável. Apesar do terrível frio e do crescente ressentimento das tropas, Alexandre decidiu conquistar o local para assegurar a  posse de suas últimas conquistas na região. Mais de 2000 homens morreram no caminho. Oxiartes e seus homens riram quando Alexandre os intimou a se renderem, pois a fortaleza se erguia a meio caminho de um rochedo escarpado e comandante do forte disse que os macedônios precisariam de soldados que voassem para atingi-los. Alexandre aceitou o desafio e prometeu prêmios aos seus homens que conseguissem escalar a montanha. Sendo a Macedônia um país em grande parte montanhoso, não era isso novidade para aqueles homens, e 300 se prontificaram a um ataque noturno surpresa. Mas mesmo assim 30 morreram na empreitada. Os sogdianos e bactrianos, embora fossem em maior número, ficaram atemorizados ao constatarem a tropa macedônica acima deles, pois eles realizaram o que parecia impossível. Para selar a paz com os rebeldes, Alexandre casou-se com a filha de Oxiartes, Roxane (Roshanak em bactriano) no verão de 327 a.C. As fontes dizem que não obstante as vantagens políticas desse casamento, Alexandre realmente teria se apaixonado por Roxane. Abaixo, o casamento de Alexandre com Roxane conforme o filme Alexandre (2004).
O casamento de Alexandre com Roxane melhorou suas relações com as tribos iranianas, mas gerou mais um descontentamento entre seus homens, pois eles venceram terríveis desafios e agora viam seu líder casando-se com a filha do inimigo. Além disso, com o casamento, Alexandre teve que despedir sua amante Barsine e seu filho com ela, Héracles. Isso pode ter gerado um grande desconforto com o pai de Barsine, o sátrapa Artabazo, que fora leal aliado de Alexandre.

Orientalização e Conspiração
O casamento de Alexandre com uma bactriana era apenas um dos fatores de escândalo que Alexandre causava nos seus conterrâneos greco-macedônicos. Ao longo de sua jornada, Alexandre foi adotando costumes da corte persa: adotou parte das vestes reais, convocou iranianos para integrarem seu exército, nomeou persas para importantes cargos administrativos.  Abaixo, Alexandre (Colin Farrell) trajando roupas orientais no filme Alexandre.
Um costume persa que consternou muito os greco-macedônios foi a introdução da proskynesis (prosternação). No Império Persa, os súditos do rei se curvavam de joelhos diante dele. Para os iranianos isso era o mais alto tratamento de respeito ao Grande Rei. Para os greco-macedônios isso era inapropriado para homens livres e tal honraria só caberia diante de um deus. Os outrora súditos dos Aquemênidas transferiram esse tratamento para Alexandre que via nele uma grande importância, pois confirmava sua realeza diante dos iranianos. Abaixo, ilustração de súditos reverenciando um rei persa.
Por outro lado, se os persas na corte de Alexandre vissem que os macedônios e gregos não cumprimentavam o rei corretamente, eles poderiam se questionar se ele era um rei de verdade. Por esse ângulo, a introdução da proskynesis era uma necessidade. Mas, isso não foi bem recebido pelos conterrâneos de Alexandre. O historiador da corte, Calístenes de Olinto, considerou o gesto sacrílilego e se recusou a fazê-lo. Posteriormente em 323, em visita à Babilônia, Cassandro, filho do regente Antípatro e amigo de infância de Alexandre, riu quando um persa se prosternou ante o rei macedônico: Alexandre ficou furioso e agrediu a Cassandro. Abaixo, cena de Alexandre onde o Conquistador confronta Cassandro.
Um incidente ligado a um costume persa gerou mais uma conspiração contra Alexandre: durante uma caçada, o rei persa deveria ser o primeiro a atacar o animal. Mas um dos pajens de Alexandre atacou um javali antes do rei e Alexandre castigou o jovem. Ele e outros pajens decidiram matar Alexandre em sua cama, mas o rei escapou, pois estava bêbado demais para voltar para sua tenda. O episódio ficou conhecido como conspiração dos pajens. O apoio rápido que o pajem teve demonstra o nível de descontentamento dos conterrâneos de Alexandre com seu rei. A conspiração foi descoberta e muitos outros foram considerados culpados, inclusive Calístenes: todos foram executados. Abaixo, representação de persas e gregos caçando juntos proveniente do famoso Sarcófago de Alexandre (século III a.C.)


REFERÊNCIAS:

http://www.livius.org/aj-al/alexander/alexander12.html
http://www.livius.org/aj-al/alexandria/alexandria_oxus.html
Castro, Paulo de. Biblioteca de História: Grandes Personagens de Todos os Tewmpos, vol. 4:Alexandre, o Grande. Editora Três: São Paulo, 1973.
Wepman, Dennis. Os Grandes Líderes: Alexandre, o Grande. Editora Abril: São Paulo, 1988.



Nenhum comentário:

Postar um comentário